Pergunto-me se estarei morta. Se serei mais um espectro que aqui anda, convencido de que está vivo quando não passa de uma alma à deriva. Pergunto-me se terei ar nos pulmões que cheguem, se tenho tempo para fazer tudo o que queria. Pergunto-me se as outras pessoas me vêem e ouvem. Pergunto-me se elas sequer fazem um esforço.
De repente tenho a certeza que respiro, tenho a certeza que continuo a ter carne colada aos ossos e sangue a correr nas veias.
Foi num dia de folga como este. Numa pausa a meio da semana exaustiva que cortou o ritmo alucinante ao qual tenho tentado sobreviver diariamente. Num dia sem doentes, sem hospitais.
Foi num dia como este que percebi que não podia estar morta.
Há sempre outra hipótese é certo. Aquela em que eu sou um zombie. Morta e ressuscitada, regressando à vida num estado precário. Com uma fome incontrolável. Fome de sangue.
Fome de carne. E muita sede.
Num dia como este, em que saciei a sede e o cansaço mas continuei com a fome. Acho que vai durar até voltar para debaixo da terra, para aquele sitio frio e escuro. Aquele sitio onde sonho acordada contigo. Acordada porque não consigo dormir. É um dos meus castigos, por causa da asneiras que fiz em vida. Ter dias intermináveis, presa numa caixa sem nada para esconder os meus pensamentos. Presa comigo própria, sem conseguir mexer os músculos, nem os mais pequenos e frágeis.
E com fome. Com fome de ti, ainda. E obrigada a pensar nas mil e uma maneiras que podia utilizar para te cozinhar. Mas preferia a cru, com uma pitada de ervas.
Sem comentários:
Enviar um comentário
memórias