domingo, 26 de fevereiro de 2012

Gene Morbydus

Já repararam de certeza que o típico portuguesinho, cada vez que passa por um acidente de qualquer espécie, até mesmo se existir uma vítima mortal esquartejada (acidental ou propositadamente) no meio da rua, forma um aglomerado de mexericos, "uhs" e "ahs" que não se distinguem por entre o barulho das sirenes e dos carros que passam ao lado. É extremamente desconcertante pensar que as pessoas anseiam tanto por um factor excitante e renovador, que quebre a sua rotina (exageradamente) monótona, que chegam ao ponto de desejar drama e fomentar este gosto que conduz ao prazer pela desgraça alheia. O que devia causar afastamento, torna-se na atracção mais concorrida da feira, não popular mas sim deste dia-a-dia que em nada é diferente dos anteriores. As pessoas procuram o mórbido, o perigo, e a curiosidade também tem a sua percentagem de influência, contribuindo para este corropio de formigas, que na tentativa de se superarem e de saírem da prisão em que se sentem colocadas, só se tornam mais pequenas e insignificantes, não sendo possível diferenciar as suas vozes, as suas caras, as suas ideias. No fundo não passa tudo de um engano, que só lhes fecha mais os horizontes, confinando-as àquele circulo de curiosos, limitados e infelizes.
Para mim, torna-se também um pouco revoltante. Se pensarem bem, essas pessoas aproveitam-se da vida (ou morte, em casos extremos de super realização para os infelizes interessados) e da desgraça de alguém que num momento de sofrimento se tem de deparar com um molho de curiosos frustrados a quem a vida não satisfaz. É como um negócio de DVDs piratas, um espectáculo ilegal ou um acto consciente e intencional de plágio. O que eu quero dizer é que é uma falta de respeito, um abuso da privacidade.
Há uns tempos atrás, minutos aliás, senti-me como essas pessoas que gostam de ver a desgraça e têm curiosidade em observar aquilo que seria preferencialmente evitável. Claro está, e digo isto em minha (não muito útil defesa), que eu não procuro tal coisa como forma de me salvar de uma prisão de vida perpétua e de alta segurança. Faço-o antes na tentativa de procura daquela sensação de nervoso miudinho que se torna agradável. Daquela repulsa, do medo que me paralisam e mais tarde são aniquilados pelo facto de os ter superado. É como se houvesse um certo prazer intrínseco ao ser humano, um gene que nos faz desejar fazer, ver ou pensar em algo mórbido. Um prazer que não devemos deixar que nos defina, mas que por vezes se torna difícil de ignorar. 
Este gene, juntamente com o meu gosto pelo corpo humano e consequente curiosidade em saber o que existe lá por dentro, de uma forma real, independentemente daquilo que mostram os livros de anatomia, foi e por vezes continua a ser o responsável por uma certa sensação de desconforto e desconfiança de mim mesma. 
Nunca pensei em matar ninguém, mas mais vale prevenir do que remediar
Por isso cuidado com esse gene, suprimam-no e não façam como o típico portuguesinho. Vão ver que os filmes ajudam, e a vida só é monótona se fizerem por isso.

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